Depois de apenas uma semana acabei descobrindo que atualizar um blog diariamente não é mole não. Falta folêgo e me sinto meio autor de novela, sempre na frente. Escreve hoje para publicar amanhã. Ainda bem que não tenho susceptibilidades globais para me aporrinhar. O bom desse espaço é que sempre há um termo se casando perfeitamente com ele. Mas não me vergo aos apelos dos patrocinadores, mesmo porque não os tenho. O que me dá uma considerável vantagem sobre a concorrência; acaba que minha pena fica livre, alheia aos desejos do mercado. Minha pretensão de sempre escrever ao seu sabor, sem orientação, sem revisão, cortes, arrumações e que tais, se consolida na madrugada. Doce ilusão de ter a rédea na mão.
Acabo sempre trocando aqui, tirando acolá. Aliás, mais tiro que coloco. Creio que esta tendência de uso indiscriminado da tesoura é um sub-produto dos anos de chumbo. Não que eu tenha estado no olho do furacão, já que em abril de sessenta e quatro eu tinha dois anos e estava perdido na imensidão das geraes. Minha geração nasceu e cresceu na ditadura, mas passei ao largo dela por bons seis anos. Só descobri sua face ao mudarmos para capital. Não só a dela, mas a de um grande mundo novo, incompreensível em princípio. Lembro-me perfeitamente do dia, logo que chegamos, em que a polícia partiu para cima de uns moços barbudos bem em frente à nossa casa. Tinha um fusquinha revirado ardendo em chamas e gente correndo pra tudo quanto é lado. Era 1968. Tinha seis anos e o mundo ardia dentro e fora de mim.
A cidade grande e suas atrações me fascinaram. A televisão foi um deslumbramento. Quantas livrarias, cada uma mais colorida que a outra. O homem na lua? Inacreditável! Mais tarde, ao ler Murilo Mendes, acabei achando que o homem na lua foi meu cometa Halley. Que por sinal tive a honra de ser testemunha oculta de sua nova passagem. Sim, testemunha oculta, pois não vi porra nenhuma. Isto muito mais tarde, já lá pelos vinte e cinco anos. Voltemos ao início de minha segunda década de existência.
A vila sésamo pintava de branco o meu sorriso desbravador do novo mundo e voando pela varig eu olhava assustado.
– Ei, Beto, você tem biscoito?
Perguntava um apatetado Enio que nem desconfiava dos encantos da Gabriela. O pateta foi outro a perambular por minhas retinas infantis. Depois vieram, não necessariamente nesta ordem, Maurício de Souza, Mad, Circo, Moebius, Manara, Geraldão, Laerte, Luis Gê, Will Eissner e tantos outros. O fato é que os quadrinhos sempre me acompanharam. Mesmo porque a principal razão de nossa mudança foi dar prosseguimento aos meus estudos, já que minha mãe, minha primeira escola, dizia não ter mais nada para ensinar ao "meu geniozinho". Ficou decidido: eu era inteligente e a academia seria meu destino. Decisão profundamente entristecedora para meu avô. Mas o velho não falou nada.
Pra mim, foi ótimo. A literatura entra de vez em minha vida e passa a fazer parte de minha gênese. Descubro a maravilha do século XX: o cinema. Vejo saias rodopiando minha imaginação febril e acabo descobrindo cedo seus aromas mais sutis. A cidade passa a morar em mim.
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