É um verdadeiro prazer, minha querida leitora, dedicar a você um textículo cujo assunto, mais uma vez, desconheço e cujos detalhes fogem aos meus olhos. Não se trata aqui, como já observado várias vezes, de examinar o fundo da temática, o que envolveria doutrinas nas quais não navego. Notemos apenas que sua sensível antena capta tudo que me escapa. E, ao perceber o que você realizou por força de sua vontade e como mudou a sua vida pelos poderes da imaginação e da análise, sinto-me menor, menos pronto a qualificar de escrita o que se segue. Bem sei de sua constante preocupação com os fenômenos artísticos aliada as inquietações metafísicas dos grandes romancistas. Para meus parcos leitores, essa coexistência, da observação e da fantasia, não aparece em meus rabiscos e é, precisamente, um dos segredos de minha medíocridade.
Há pessoas, boas e pacientes como você, que passam pela vida com um pensamento doce no coração e a suave serenidade de um sorriso terno nos lábios. Há outras, como eu, sempre alertas para a ironia, que fazem do escárnio a grandeza de suas cenas. A senhora já deve ter notado as desilusões e os dissabores marcando as rugas reflexivas de minha empáfia literátia. Acredito, por outro lado, que tenhas percebido, ao contrário da Clarice Lispector, que estas narrativas não passam de uma gralha crocitando. Antes de ir adiante lancemos o olhar um pouco mais adiante. É possível que minha meticulosa leitora goste de encontrar aqui, antecipadamente, uma espécie de opressão mascarando a delicada aurora, velando o estado fragilizado do autor.
Na verdade, minha extraordinária graça, as luzes sombrias da desgraça colorem meu rosto lívido e minha doce resignação não passa de uma câmara mortuária revelando a miséria suprema. É uma espécie de sinistro pressentimento, uma indefinível e confusa visão do futuro. Como uma hiena diante da carniça me debruço em um sentimento difuso, me contorço e experimento uma derrota íntima, daquelas profundas, essas profundezas com que os grandes pintores colocam em relevo a alma do objeto, ou pessoa, ou paisagem pintada. Como sempre é preciso aplicar as leis da arte narrativa, com essa última assertiva, cuja despropósito é óbvio nessa narrativa, termina aqui esse textículo.