terça-feira, 5 de julho de 2011

Cidade Silente.

O silêncio se apoderava da cidade, mas não era a quietude das noites estreladas dos trópicos, não se tratava do doce sossego de uma sinfonia cuja primeira estante comportava grilos, ao fundo a precisão percussiva dos sapos e o suave cântico da coruja em um mavioso contraponto. Era o mutismo impregnado de ruídos. Estertores macabros turvando a morada tranqüila – com trema – de mentes obtusas. O segredo que agora tomava conta da cidade era uma mudez de mordaça, camurça pusilânime e passiva.

Não me recordo ao certo como começou. Mas uma névoa densa deixa entrever, no início de tudo, a necessidade da felicidade, revelava de maneira sutil o advento da gentileza fácil e fútil. Depois as piadas foram se calando, sobretudo as que se referiam aos supostos homens de bem. Questionamentos foram sendo delicadamente, via jurisdição da ordem, trancafiados na solene expressão do desprezo, da mesma maneira que o sorriso fácil e a elegância da polêmica foram sendo escanteados sem direito à um levantamento de bola para a área.

A cidade silente me lembrava tempos tenebrosos, mesmo aos meus olhos de criança. Só que dessa vez veio transmutada em consensos diversos. Me pego perguntando se certo dramaturgo e sua objetividade dos idiotas, não teria tido o vaticínio temporão de um profeta... O mais assustador é perceber que a total falta de som se harmoniza com o estardalhaço da comunicação. Nunca se falou tanto e nunca fomos tão surdos. Em nenhum momento da história humana se escutou tanto e tão pouco se conversa. Blocos sonoros superpostos bloqueiam a visão e aparam a língua. Esse é o tempo que me cabe. E parafraseando um velho mestre: tempo de homens calados.

Não me queixo. Afinal o que seria de mim sem um miojo no armário? Poderia sobreviver sem o sorriso branco que só Colgate dá? Teria eu condições de passar sem a dose diária de sabedoria do livro traduzido para milhares de idiomas? Seria ao menos capaz de existir sem asas? Estaria apto a dirigir meu belo Ford completo sem ao menos ter experimentado o suave sabor? Esse é o tempo que me cabe.