quinta-feira, 31 de julho de 2008

Olhar, olhares...

De certa feita dei com as fuças em uma cidadezinha onde se preparava um festejo. Se quer ouvir, narro-lhe; não um feito, mas especulações. Cidade limpa, passada e exata para o evento. Eu estava chegando, o arraial todo tranqüilo. Parei-me à porta da estação. Observei a praça da matriz engalanada, ainda calma. Afinal, o que eu viera fazer aqui? Nem eu mesmo sabia. Uma atração irrestistível se apoderou de mim desde o dia em que assisti um documentário sobre essa cidade. Não tinha nenhum projeto em mente, apenas uma correnteza violenta me arrastando para essa terra perdida no meio do nada.

E foi assim que entrei em um lugar esquecido nos confins do tempo. Me lembrei imediatamente do Junco, "lugarejo de sopapo, caibro, telha e cal". Minha vida mudaria radicalmente. Ao avistar a santa, a multidão começou a gritar, admirando a sua beleza. As formigas cantavam em seu louvor; os pássaros cantaram, as pedras rolaram ressoando uma canção, os mortos voltaram a viver, espíritos foram vistos e dois cães uivaram simultâneamente. Tudo isso que foi mencionado é o povo da cidadezinha, que se tornou visível quando de minha chegada, o "seu filho" testemunhando a posição suprema do canto, da dança e da poesia na celebração de chegada.

Seria uma reedição do capitão Cook? Suposição tola e pretensiosa. Nada que lembre os cânticos de vênus havaianos. A flor que desejo trançar e amarrar não é a mesma que se apodera de meu corpo. Não é o poder da paz e relaxamento proporcionado pelo líquido jorrando no penhasco. É a simples evidência de minha fuga gerando um cenário tosco, feito de papelão usado. A porção mítica, coisa naturalmente inquietante, desaparecida em mim, aflorou de sopetão. Ao me deparar com todo aquele arsenal festivo dei-me conta de minhas raízes superficiais, não que elas sejam rasteiras. As raízes de um ficus, minha vó chama de gameleira, arrasa tudo em volta, embora estejam expostas às intempéries.

Como um deus invasor instalei-me a cerca de hora e meia a pé, necessário dizer que ando rápido. Comprei um belo pedaço de terra e tive a certeza que jamais sairia dali. De início recluso, quase ermitão, aos poucos fui fazendo amizade com o povo da terra. Naturalmente o primeiro foi meu vizinho Adão. Fazendo divisa comigo pelo lado leste todinho, era um sujeito preocupado com a nascente, justamente incrustada em minha propriedade. Não havia motivo para preocupações. Eu não mexeria em nada. Tinha dinheiro o suficiente para não ter que comercializar, não plantaria uma mandioca sequer. O que já não é mais poupação de porra e sim seca total. Apenas recuperaria um trecho degrado e plantaria umas árvores frutíferas que não tinham ali. A fazenda estava bem cuidada, não havia necessidade de se mexer muito. Lembrei-me de meu avô. Será que o velho concordaria com isso? Não teria sido melhor voltar para a fazenda? Na verdade eu sei a resposta. Mas ele há de compreender minha decisão.

Estranhamente, a primeira vez na cidade, depois de minha mudança definitiva, tive uma sensação desconfortável, oposta a de minha chegada. A placidez foi substituida por um alvoroço violento. Recém-chegado, um grupo gritava no único bar. Seria bom notar a ausência da duplicidade. Apenas um açougue, uma farmácia, um médico, um palhaço, um escritor, um professor. Tudo um. Onde eu me encaixaria nisso? Se é que haveria um espaço para mim nesta cena. Um pequeno grupo olhava curioso aquelas pessoas esquisitas, barulhentas, sem modos. Vagarosamente o grupo foi aumentando ao ponto de todos habitantes da cidade estarem olhando fixamente para os estrangeiros. O grupo vagarosamente diminuiu o tom das brincadeiras jocosas, silenciou e, finalmente, foi embora sem falar nada.

quarta-feira, 30 de julho de 2008

A Sombrancelha

Ia de vez em quando em um dos butiquins – apresso a dizer que são vários, de todos tipos e feitios – que costumo ir, um sujeito muito esquisito. Melindroso, sistemático, todo certinho. É daqueles do tipo é ou será, porque já foi nunca ouvi dizer. Nem com muita reza em cima escapa. Não coloco minha mão no fogo de jeito nenhum, aliás fico o mais longe possível. Cada um cuide de seu brioco, pois eu sou muito cioso do meu. Pode vir com qualquer teste da farinha que passo com louvor. Essa era uma das polêmicas mais tolas daquele pé sujo: é ou não é? Eu não tinha dúvida nenhuma e tenho olho clínico pra sintoma de viadagem. De certa vez o rapazinho chegou no buteco todo arrumadinho. Sabe aquela roupa da missa dominical? Pois é, o cara tava melhor ainda.

    - Rapaz, você contratou um personal style?

Hoje é personal pra isso, praquilo, praquiloutro. O que me deixa pasmo, pois não sei se as pessoas decidem algo em suas vidas. Livros de auto-ajuda pipocam, vendem mais que chuchu na feira. Vejo uma pasta amorfa, perdida na indistinção de seres vazios.

    - Você tá me sacaneando?

    - Absolutamente, só adorei seu modelito longo para noite.

    - Gostou, foi? Querendo usar é só falar.

Sei não... essa fanta é uva. Pensei comigo ao deitar um olhar mais aprofundado na figura. Até então estava meio alheio àquele rebuliço inicial da noite de sexta-feira. Andava meio preocupado com um artigo se arrastando e o tempo voando. Acabei não me desligando totalmente do trabalho e o assunto que tomava conta de meus pensamentos não interessava à pauta do bar.

    - Que o que! Tenho um nome a zerar. Imagina, eu aprumado dentro de um troço desse. O que vou dizer lá no Ceará?

    - Deixe de bobagem, o mundo mudou. Hoje em dia as pessoas não ligam.

    - Vai dizer dizer isso lá em casa

O nosso dândi estava uma coisa. Mais esvoaçante que garça no final da tarde. Uma camisa tipo cacharel furta-cor, uma calça boca de sino branca e uma echarpe vermelha. Só faltou o cavalo-de-aço.

    - Isso aí é que é o tal do metrosexual?

Perguntou à meia boca um gaiato. A bicha causou furor no estabelecimento. Aí é que ela se pavoneou de vez. Abriu plumas, paetês e purpurina. Pensei comigo mais uma vez: "Não, isso aí é uma bichona mesmo".

    - Ei, você tá com uma sombrancelha maior que a outra.

    - É mesmo? Ai que horror.

Primeiro foi ao banheiro para se certificar. Depois saiu desabalada gritando quadra afora. Acho que foi retocar a maquiagem.

terça-feira, 29 de julho de 2008

Vagamundo

O butiquim acabou se tornando meu grande companheiro nesta nau-vegação blogueira. Pois é do fundo do bar, envolto em andrajos, surge nossa personagem, que já não é mais diária, haja vista a ausência de crônica em dois dias seguindos, já não posso me gabar deste feito. Desafiando o tempo meu vagamundo rompe a soleira. Ar altivo, elegante em sua barba imensa, olhava por cima o ambiente. Não tinha o ar aparvalhado de costume dos andarilhos. Como sou bisbilhoteiro e vivo procurando atrativos no dia a dia, reparei imediatamente na pinta. Não demorou muito se acercou de minha mesa. Convidei para sentar e paguei uma pinga.

    - Tá vindo de onde?

    - De longe, moço.

    - E longe é onde.

    - Já andei muito, nem me recordo mais dos lugares que conheci. Só lembranças embaçadas pela cachaça. De certo é que, de último, venho da Bahia. Cheguei coisa de quatro dias. Estou só de passagem, nunca páro nos lugares. Vou por aí, vagando mundão afora. Coisa de anos.

Minha curiosidade era tanta que fui indiscreto demais, especulei, assuntei. Mas nem precisava. O cara era boa praça, gente fina. Ilustradíssimo. Aos poucos e com generosas doses de aguardente a língua destravou.

    - Houve um tempo em que tinha casa, família, filhos, irmãos. Essas coisas todas. Era um tempo bom, nem lembro mais. Sabe, minha memória falha muito. São impressões que se confundem com visões. De certo, bem vivo, a lembrança dos filhos. Dois meninos e uma menina, lindos. Acho que o mais velho deve ter uns dezoito anos, o do meio uns dezeseis e a raspinha do tacho uns dez. Ela veio depois. Aí aconteceu. Garrei com a danada, não larguei mais e saí mundo afora. Nunca mais vi ninguém, não sei notícias e nem eles tem novidades minhas. Isso deve de ter uns nove anos. Sabe o que mais doeu? A indiferença de todos. Sofri muito, sozinho, enclausurado na chaga que me carcomia. Tive crises profundas de depressão. O pior de tudo é que eu não bebia. Havia bebido só uma vez, na adolescência, achei horrível aquilo. Para suportar a solidão e a loucura que se instalava em mim, passei a beber. Nada mais tinha sentido. Já havia perdido tudo e o mostro se revelou. A branquinha passou a ser meu consolo, minha morada e namorada. É... eu tinha posição, bom trabalho, boa casa, carro do ano. Perdi tudo! Não pense o senhor, como todos fazem, que foi a mardita. Ela só veio depois. Antes a angústia, profunda. Passei dias sem sair de casa, sem comer, nem beber. Quando me acharam estava quase morto. Emagreci mais de dez quilos. Foi a última vez que vi todos. Amigos, parentes... Ali, naquela enfermaria, meu destino se selou. Sabe aquele movimento de segundos marcando toda uma vida? Foi o que se deu. Imagine o senhor que durante todo o tempo que fiquei lá, acho que dois dias, um tiziu me fez companhia. Só voava quando chegava gente, que para minha alegria era pouca. No dia seguinte levantei, vesti a única muda de roupa e coloquei o pé na estrada. Não olhei pra trás e desde então vou indo, sempre mais longe. Desse jeito vou parar na terra do tio sam. Bem, vou indo, tá na minha hora. Foi um prazer e creio que não nos veremos outra vez. Muito obrigado pelas doses e pela comida.

Fiquei sem saber ao certo o que aconteceu. Algo que o derrubou, isso com certeza.

sábado, 26 de julho de 2008

Causos e Cousas Miúdas

Duas semanas no ar. Abobrinhas da terra de pindorama pulularam nesta cama eslástica. Causos e cousas miúdas desfilaram. Meu único leitor deitado na rede não se compadeceu deste pobre escriba e desceu o pau na falta de novidade, de criatividade, de profundidade e coisas e tais. O distinto ainda observou uma série de repetições, expressões gastas, linguajar pouco apropriado, frases feitas e outras e tantas mesmices. Em razão disso, hoje posso me dar ao luxo de dizer asneiras sem que meu único leitor dê por elas. A única causa não é outra senão a de ser o leitor cioso de sua verdade.

Machado de Assis em texto – do qual lançarei mão de alguns procedimentos nessa crônica, pois nosso bruxo não é nenhum mago de meia pataca – de 1876, "História de Quinze Dias", vai nos dizer que a crônica trata de "cousas ínfimas". Surgida de um lance de dados, um acaso, uma lorota contada entre vizinhas faladeiras, esse textículo estaria impregnado de leveza. Ao tratar de temas diversos, com linguagem tirada do cotidiano das ruas, que, aliás, seria outra de suas características, ligada diretamente aos pequenos acontecimentos de seu tempo, a crônica abordaria preferencialmente "cousas doces, leves, sem sangue nem lágrimas". O bruxo começava a pensar nessa nossa instituição literária: a crônica.

Essa suposta leveza acabou por colar na crônica o estigma de bastardinha da literatura. Mesmo os mais simpáticos à ela, deixaram-se levar por análises reducionistas. Como é o caso, por exemplo, de Antonio Candido. Ao dizer que "A sua perspectiva não é a dos que escrevem do alto da montanha, mas do simples rés-do-chão", nosso estimado crítico a caracteriza como um tipo ligeiro e despretensioso de literatura. As armadilhas são inúmeras.

Com este epíteto de efêmero colado em sua face, a crônica desbravou preconceitos e se tornou por excelência a pena desses tristes trópicos. Não seria Noel Rosa um autêntico cronista? Aliás, foi na parceria com a música que nossos literatos de gêneros menores, ligeiros e passageiros, conseguiram grandes proezas. Interessante notar a relação existente entre a crônica e a micro-história dos italianos. Partindo de um detalhe traça um longo e minucioso painel da vida sóciocultural de um tempo longo. A literatura e a história: uma relação íntima e perigosa. A crônica e a literatura brasileira: um caso de amor.

Minha intenção não é montar uma exposição panorâmica de meu tempo, o que seria de uma pretensão incomensurável. Nada mais quero que o "prazer do texto"como preconizado por Barthes. Procurar nas fissuras, nos interstícios, o texto de prazer: aquele da fruição, que contenta, enche de euforia, que vem da cultura, não rompe com ela, aquele que desconforta. Enfim, como diria o bardo gaulês: "o que eu aprecio, num relato, não é pois diretamente o seu conteúdo, nem mesmo sua estrutura, mas antes as esfoladuras que imponho ao belo envoltório: corro, salto, ergo a cabeça, torno a mergulhar. Nada a ver com a profunda rasgadura que o texto da fruição imprime à própria linguagem, e não à simples temporalidade de sua leitura".

sexta-feira, 25 de julho de 2008

Festa no Céu.

O bom de se ter esse diário, que não sei até quando manterei ao mesmo tempo em que tenho a impressão de que não o pararei, é que ele tem me ajudado a tirar a poeira de livros esquecidos na estante. Fazia tempo que não lia crônicas com regularidade. Não que tenha sido uma opção, mas as imposições de um tempo onde o pouco espaço para leitura estava destinado aos textos obrigatórios. Crônicas e poemas? Só os que se encontravam em meu farnel, aquele de crônica anterior. Agora tenho lido compulsivamente. Um retorno no tempo. Houve uma época em que eu só lia crônica. O enstuasiasmo inicial de escrever uma crônica diária foi diminuindo. Acabei percebendo como repito frases, expressões e como a temática é traiçoeira. Um temor antigo se iluminou: o medo de não ter mão leve para essas coisas.

Mas insisto, persisto e vou cavando assunto. Certa vez fomos à feira de troca de Olhos d´água. Vilarejo já bastante conhecido meu, pois ia muito, até de bicicleta já fui. A corrutela fica mais ou menos a oitenta quilômetros de Brasília. Preparativos intensos e planejados. A grana era curta e não poderíamos ficar bebendo cerveja que era coisa de barão. Comprou-se, então, três garrafões do famoso vinho francês sangue debois, cinco garrafas de vodka, daquelas mais baratinhas e uma caixa com doze garrafas de três fazendas. Só para sexta de noite, sábado e domingo de manhã dá. Suposição que se mostrou infundada. A matula etílica só durou até a tarde de sábado. Apenas no trajeto para Alexânia, pouquinho mais que uma hora, foram-se duas garrafas de vodka.

Despensa abastecida, hora de partir. Parte do grupo partiu de baú até a cidade já citada, o resto do caminho – mais ou menos treze quilômetros – seria feito a pé. Encontravam-se neste grupo eu, a R. O Murugas, o Maguim, o mamau e a namorada de R. O maguim já desceu do ônibus pronto. Comprido, uns pés imensos e magro, muito magro. Tava parecendo coqueiro gigante em dia de ventania. Pra lá e pra cá. O estado dele deixou-me apreensivo. Como esse cara vai andar tudo isso? Iniciamos o périplo. E o Maguim ria, corria feito maluco na estrada empoeirada. Ao sairmos da cidade o céu iluminou. Meu irmão e um amigo dele, que tinham vindo de carro, passaram e arrebanharam o Maguim. Alívio geral. Imaginou? Carregar a manguassa alheia... E lá fomos nós: cachaça, pernada e baseado. Quase chegando no arraial, já um escuro danado, o Murugas grita alucinado:

    - Mermão, olha só praquilo... Que luz estranha. Cês viram?

Olhamos e não vimos nada. Ou melhor, cada um viu o que a sua cota de álcool lhe mostrou.

    - Pô Murugas, tá vendo coisas. Essa sua pinga tá estragada. Falou o Mamau

    - Nada mermão, acho que era um alien.

Nisto a R. e sua namorada estavam lá na frente e não viram nada desta cena intergalática. De repente um berro.

    - R. onde você está?

Silêncio total. Só os grilos cantando sua ladainha noturna.

    - Pô mermão, não falei. São os caras. Levaram a R.

    - Deixe e maluquice e vamos ver o que é.

Falei e corri para onde estava a namorada de R., A doida havia entrado no meio do cerrado. Como eu era um sujeito acostumado a acampar, peguei de minha lanterna e lá fui: salvar a R., Tarefa ingrata, pensei. Como vou achar essa neguinha mais negra que andorinha nesse breu de noite sem lua, diacho... Achei a outra viajando. Deitada, os olhos tão arregalados que brilhavam, olhava aquele mundo de estrelas e não tinha a mínima noção do que acontecia em volta dela. Quando viu a luz da lanterna limitou-se a dizer:

    - Apague a luz que os pirilampos estão fazendo uma festa no céu.

quarta-feira, 23 de julho de 2008

A Censura.

Gostaria de tecer alguns comentários sobre este espaço. Tenho cá comigo e meus botões a liberdade de expressão como símbolo maior de minha razão de existir. Ao escrever o autor é livre de toda e qualquer amarra, como já insinuei em poema publicado no meu quarto livro. Da mesma forma que ao bebum lhe é assegurado proferir suas bobagens com todos pingos nos iiiss. Os ditos enfáticos, cheios de verdades são quimeras da verdade e companheiros de copo. A gravidez de ouvido é a mãe da ignorância. E tudo não passa de balela se ao criador lhe é vedado o direito sagrado de sua pena.

Pior que a arrogância de sapientes é a estultícia acomodada. Aquele saberzinho de início do dia, sonolento, confundindo o claro com o escuro, não divisando senão uma nesga de luz. Esse é terrível. Está escorado por pilares perversos, totalitários e cheios de trevas. Se perde no senso comum da realidade deliberada pela midiotização. Desta maneira, a única solução é chafundar na medíocridade cristã e orar pelos censores de plantão. Tive contatos com a Drª Solange e toda estrutura que a cercava. Sim... aquela da Polícia Federal. Ali, no final da Asa Sul, onde se pedia a liberação de publicações, peças, shows etc. Pensei que os anos de chumbo se resumia agora à abertura dos arquivos. Coisa que ansiamos, que é nosso direito e que governo após governo não se concretiza.

A hipocrisia reina. Faça o que eu falo, não faça o que eu faço. Eis aí a máxima dessa turma liberal. Engomadinha em sua vidinha sem perspectiva vai arrotando camarão depois do feijão. Puro, pois a carestia tá braba. Ainda se vangloria de ser exemplo de moral. Como essa horda me enoja. Ao mesmo tempo em que encoraja seu filho adolescente a comer a filha do vizinho, vai descendo a porrada em quem tiver a ousadia de olhar para sua princesinha. "Assim é se lhe parece". Não lembro quem escreveu isso, acho que foi o Millor.

As personagens transitando neste espaço são surreais. Há de tudo: verdades, mentiras, invencionices e fantasias. A parte que se confunde – quero sublinhar o confude, só se confunde – com a realidade é a que diz respeito ao autor. Apenas quando o texto se refere a minha pessoa, o autor, é que há algo que podemos chamar de realidade. Algumas personagens carregam muito do acontecido e bastante exagero da escrita. Outras são fantasia, máscara, representação e não passam de delírios da mente do autor ou/e do narrador. O narrador é invencionice pura. Vou procurar estabelecer limites bem definidos entre o narrador, o autor e as personagens. Com o tempo cada voz dessa polifonia vai acabar assumindo sua linha melódica e meu único leitor deitado na rede não irá se confundir.

Feitos os esclarecimentos creio poder prosseguir em minha jornada de escriba nessa "Lira do Delírio", ou melhor, nesse poupadordeporra. Vamos procurar fazer desse minifúndio um canteiro onde as enxadas sejam apenas para desbravar novas delícias. Termino lembrando de J. D. Salinger em "O Apanhador no Campo de Centeio"quando sua personagem Holden Caufield nos diz: "Bom mesmo é o livro que quando a gente acaba de ler fica querendo ser um grande amigo do autor pra poder telefonar pra ele toda vez que der vontade". E acrescenta: "Mas isso é raro de acontecer".

Amores e Dissabores.

No final dos anos setenta e início dos oitenta a província de Brasília fervia. Comandava a Fundação Cultural um artista plástico com um certo trânsito entre os militares. Nosso estimado Rubem Valentim, dali da 508 sul, no antigo quadrilátero da arte brasiliense, bradava a liberdade em tempos obscuros. Foi assim, entre o Cine Brasília, o Cine Cultura, o Teatro Da Escola Parque e seu balão de ensaio, o Teatro Galpão, o Galpãozinho e o Beirute, que acabei me envolvendo com a cena artística da cidade. De vendedor militante de jornal subversivo, como Versus, Coojornal, Movimento e outros, passei a ator, poeta, músico, crítico e ativista libertário. Desde priscas eras que minhas garatujas são partes vitais da minha existência e já havia um tempo que a música se tornara caminho obrigatório. Mas, ator e crítico... novidade das novidades.

Era tempo da poesia marginal, do teatro do invisível, da abertura gradual e lenta, das diretas, do consulado cearense anunciar um pavão misterioso, da dona redonda explodir no padrão globo de qualidade, do projeto pixinguinha, da galeria cabeças, dos baculejos – toda sexta-feira, invarialvelmente – no Beirute e do meu primeiro livro publicado. Orgulho dos orgulhos: três mil exemplares vendidos e/ou doados Brasil afora. Bancou, inclusive, duas salvações. Uma minha e de Lago e outra de Rios. Não pense, meu único leitor deitado na rede, que a criatividade deste escriba extrapolou os limites do bom senso. Lago e Rios são sobrenomes de meus diletos companheiros. Essa eu conto depois. Merece uma crônica só dela, sobretudo eu e o Lago.

E fui passando para a maioridade no meio da maior muvuca. A província crescia e eu junto com ela. Os lacerdinhas, embora ainda dessem o ar de sua graça, já não eram tantos. A poeira que afogava os primeiros habitantes ia se transformando gradativamente em um belo jardim. A cidade moderna se modernizava. Alguns companheiros torciam o nariz pra mim. É que eu lia Borges, Heidegger, Nelson Rodrigues, Camus. Aliás, eu lia até fotonovela. Tudo que caia na minha mão era devidamente devorado. No meu modo de entender, o mais injustiçado era Camus. Acusado por ter uma visão política mais limpa, não querendo esconder os expurgos soviéticos se torna o êmulo de seus contemporâneos de vistas embaçadas. Ainda por cima ouvia Pink Floyd, bossa nova, Yes, Rolling Stones, jazz, música erudita. Até parecia que para ter consciência sóciopolítica era preciso ser uma topeira e ficar tomando porre de Geraldo Vandré. A patrulha era foda. E esse estigma de politicamente incorreto me persegue até hoje. Até mesmo, dizem, esse arzinho esnobe de intelectual sabichão.

Foi o tempo de vender os livrinhos de mão em mão. Primeiro ajudei o Niki a vender. Uma vez vendemos um monte em um show que não me lembro qual no Ginásio Nilson Nelson. Depois os meus. De mão em mão, de bar em bar, de garrafa em garrafa a minha estréia literária se deu aos exatos dezenove anos. Foi lançado pela Reprint, editora do saudoso amigo Ita. Ajudei a montar os linotipos. Linotipos? Que porra é essa? Coisa das antigas. São poemas de um adolescente encantado com a vida, com seus prazeres, sua irresponsabilidade, seus amores e dissabores.

Foi por esse tempo minha experiência como ator. Entrei para o grupo Carroça, dirigido pelo Humberto e com grandes amigos. O Lago era um deles. O Miguel. A Mauí. A linda Isabela. O Márcio. Amigos de um momento muito feliz de descobertas. Era como se o horizonte fosse muito limitado para nossa ânsia de enxergar, compreender. A cena teatral era intensa. Um amadorismo gostoso. O Chico vagando no distanciamento de Brecht e a gente fazendo pesquisa sobre a Capital da Esperança.


 

terça-feira, 22 de julho de 2008

Rodriguiana

Havia um sujeito que estava sempre bebendo lá no butiquim. Caladão, poucos amigos e sempre muito pensativo. Aparentava ter seus quarenta e poucos anos. Apenas o cumprimeto de praxe entre pessoas sempre presentes no recinto e que se conhecem de vista. Um belo dia, estando eu sozinho no escritório etílico, o cara resolveu puxar conversa comigo.

    - O senhor sabe a diferença entre saber e ignorar?

Não entendi nada. Seguindo o vício da profissão, tentei ser o mais didático possível em minha resposta. Apelei primeiramente para o dicionário, para em seguinda vomitar um longo discurso onde se sobresaia minha pretensa erudição. Tive como resposta isto:

    - É, o senhor não sabe e não é ignorante. O senhor querendo saber, mire e veja. Há coisas no mundo que fogem de nossas mãos. A gente acha ter o controle de nossa vida. Bobagem. Nada pode ser determinado. Nem as relações de parentesco. Quando a gente pensa que sabe quem são seus pais, seus filhos, sua esposa, seus irmãos... Tolice.

Continuei sem entender patavina. Algo de taciturno em seu semblante e em sua voz denunciava dores profundas, daquelas sem solução.

    - Veja bem, há coisa de cinco anos conheci uma garota bem mais nova que eu. Ali, com seus dezesete aninhos. No princípio nem notei a garota. Mas a insistência com que me olhava acabou desviando minha atenção pra ela. Estava em pé, na porta de entrada lateral do Beirute. O Senhor conhece o Beirute?

- Conheço. Eu ia muito lá. Lugar democrático, alternativo, né?

- É... Essa mocinha veio até minha mesa e pediu para sentar. Embora quisesse ficar sozinho, concordei com que se sentasse. Nem precisei fazer esforço para conversar. Ela não deixou. Parecendo um vulcão em atividade máxima a menina ia falando sem parar. Fiquei sabendo tudo que ela lia, via, fazia. Só não falou de sua família. Do resto, namorados, primeira transa, baseados, festas etc, falou de tudo. Depois de longos minutos ela descansou e começou a me fitar com um belo sorriso. Esse sorriso... Eu conhecia esse sorisso de algum lugar. Indaguei sua origem. Tergiversou e saiu pela tangente não me oferecendo nenhuma informação. Pra encurtar o assunto: acabei me apaixonando pela ninfeta. Eu sabia o rídiculo da situação. Namorar uma menina mais nova que eu vinte e cinco anos? Coisa de velho babão. Nunca fui dado a Nabokov. Sempre preferi as mulheres mais velhas, aquelas maravilhosas professoras. Essa, entetanto, tinha algo que me arrastava. Namoramos um ano. Eu sem conhecer a família dela e ela a minha. Ficou combinado isto: nada de famílias no meio. Até que aconteceu. Casualmente encontramos sua mãe na comercial da 108 sul. O céu afundou diante de meus olhos. A Igrejinha me pareceu um castelo assombrado. A academia da Norma Lilia rodopiou em minha cabeça embriagada. A mãe dela era a Lúcia, antiga namorada que nunca mais havia visto. O término de nosso namor foi traumático. Ela ficou me odiando. Coisa que nunca entendi direito. Tá legal, eu era um vagabundo de marca maior, mas daí a me odiar a ponto de nunca mais querer me ver? A reação de Lúcia foi ainda pior que a minha. Evidentemente ela havia me reconhecido. Ficou parva, atônita e não pronunciava uma palavra sequer. Quando fui apresentado como namorado... aí a vaca foi pro brejo. Os pacotes segurados por ela cairam e escutei um monte de vidro se partindo na calçada. Lucia quase desmaiou. Tivemos que segurá-la. No momento pensei apenas em nosso passado e achei ser apenas o grande ódio estampado na pele. Tola ilusão. Não era nada disso. O assunto é escabroso para a moral cristã de nosso formigueiro. Refeitos do susto, nos sentamos em um restaurante. Indaguei a razão de tanto alvoroço. Antes não tivesse perguntado doutor. A menina era minha filha. Aí não enxerguei mais nada. Eu estava comendo minha filha. "Porra!" Gritei pela primeira vez na minha vida. "Você não me falou nada? Como? Eu era um menino, mal gozava. Que merda você fez sua irresponsável". Ia gritando cada vez mais alto. Desnecessário dizer que nos tornamos o espetáculo da platéia. Após impropérios impensáveis em minha boca calei-me, aturdido e perdido. Aos poucos minha razão voltou e vi que era bem possível mesmo aquela menina ser minha filha. Desde o início algo familiar. O sorriso, a tranqüilidade ao falar, os olhos pequenos de um verde-azulado profundo. Sem se falar em meus quatro filhos e outros tantos abortos. Minha porra sempre foi um perigo. E nunca poupei. A garota foi o início e o fim de minha longa carreira de reprodutor. O senhor vai me desculpar, acabei falando demais e está na minha hora.

O cara pagou a conta e se mandou rapidamente. Estava um pouco alto, nada que não o permitisse chegar em casa. Nunca mais o vi. O dono do butiquim me disse que ele havia mudado para o Amapá.

segunda-feira, 21 de julho de 2008

A Boca do Inferno da Televisão.

Abro espaço hoje para falar da grande véia desbocada. Seguindo os passos de Bandeira, guardando as devições proporções, eu imagino a Dercy Gonçalves no céu. Dercy escrachada, sem papas na língua, Dercy sempre provocando. Penso nela entrando no céu:

    - São Pedro, seu puto, vai tomar no cú e abre logo essa porra aí.

Acho que ela é perfeita para ser a madrinha deste blog esculhambado. O que você acha meu único e desocupado leitor deitado na rede? Creio que ela se encaixa feito uma luva. Como não poderia deixar de ser, em se tratando dela, houve barraco em seu ato final. Um professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro aprontou a maior confa no velório da dinda. Vociferando, parecia chamar para si as forças abissais da defunta. Sem o baixo calão da mesma. Foi devidamente recolhido aos costumes e agora vai gastar uma grana com advogado. Voltemos. Ah... sempre as digressões. Agora está lá: caras, bocas, trejeitos e palavrões no céu. As forças celestiais torceriam o nariz? Nada! Com certeza conquistaria todos. A seu modo, é verdade.

Lembro como eu ria, moleque ainda, das bobagens desse ícone do humor mais escrachado possível. Aliás, essa época do politicamente correto é um saco. A gente fica até com medo de contar piada. É a porra da Sociedade Protetora dos animais, das bichas, dos portugueses, das loiras, banindo sumariamente a farta temática da piada pronta e enchendo o saco. Ainda bem que nos resta o congresso. Por falar nessa instituição mor da democracia é preciso esclarecer aos berros que a cidade não é o congresso. Essa estúpida idéia que a imprensa difunde é uma associação infeliz. Cumpre lembrar ao país a origem destes senhores, que aqui aterrisam às terças e se mandam na quinta. E como negar o fato de o congresso ser a cara da nação? A cidade pulsa por trás dos bastidores do poder. Talvez por isso a população Brasiliense tenha uma consciência política um pouco maior que a média nacional. Esta intimidade com o poder acaba criando um tipo de eleitor esclarecido: conhece os meandros mais íntimos da máquina administrativa. Mais uma vez as digressões.

Voltando ao assunto. O caso é que ela se foi. Vai agora esculhambar em outra freguesia. Talvez com uma pláteia menos empolgada, mas fiel. A vertente do humor mais chinfrim perde seu grande expoente. Acho que há uma escola brasileira do humor, bem diferente de Bernard Shaw e distante de Woody Allen. A palhaçada foi sendo construida mais próxima do circo, das feiras, do palavreado chulo da ralé. Para maiores informações sobre a importância do vocabulário no reino cômico consultar o mestre Bakhthin e seu famoso livro "A Cultura Popular na Idade Média". Segundo a filha da humorista, até na hora de ser internada ela armou barraco. Os médicos, em sua infinita paciência, com certeza perdoaram a atriz que não demoraria muito para sair de cena. Parece até sacanagem: não demoraria muito para sair de cena. Como pode fazer sentido isso. Um século e um ano de vida. Lúcida, a boca do inferno da televisão, apontava sua metralhadora para todos os lados.

E a cortina se fecha.

domingo, 20 de julho de 2008

A Madame do Vira-latas.

Eu já falei aqui do vira-latas. O cara é uma fonte inesgotável para minha falta de criatividade. Acho que não disse que ele morava em cima do bar, um cubículo de fazer inveja às solitárias da papuda. Tinha lá suas vantagens. Por exemplo, o vira-latas instalou uma roldana na janela. Vira e mexe a gente via aquela cesta descendo com cascos de cerveja vazias e subindo cheios. Às vezes colocava a cara na janela assuntando a freqüência do buteco. De outras ficava debruçado, gritando lá de cima:

    - Ô cambada de vagabundo, vocês não tem o que fazer não? Quero dormir, porra!

Ele se esquece que foi o último a sair, apagou as luzes do bar às cinco da madruga. O que temos a ver com isto? Nós, bebedores diurnos. Ninguém mandou alugar um barraco em cima de um buteco. Além do mais, ele era mais que habituer. Comandava a área. Como ele mesmo dizia com a cara na janela:

    - Aí rapaziada, já vou descer pruplay.

O playground do bacana. Durante um certo tempo ficou casado. Casamento super comportado. Porrada era o de menos. Um dia a patroa amanhecia com hematomas pelo corpo, no outro o vira-latas aparecia mais amassado que jornal velho. Comparada à moça S., aquela de sua primeira aparição, a patroa era uma deusa do Olimpo. Louca de jogar pedra na lua e acertar. As brigas constantes já não nos assustavam mais. Só que um dia o barraco implodiu. A gente lá, na maior lorota de mesa de buteco, quando do nada surge uma geladeira voadora acompanhada de gritos. Seu filho da puta, vagabunda, corno, vaca. Agora passou raspando um rolo de macarrão. Os gritos começaram a ecoar pela pequena escada de acesso à cela. Eis a cena diante de nós. A riqueza dos carinhos, traduzidos em merda para a madame e porra para o vira-latas, o que o torna personagem nato deste diário de uma crônica anunciada, aumentou sensivelmente. Discurso grandiloqüente dos amores humanos. Realmente, o amor é lindo. O que mata é a falsidade.

    - Você é um vagabundo. Ordinário que não vale a merda que caga.

    - Sua vaca louca, vou te internar. Você quebrou a geladeira, porra.

    - Vá se fuder! Eu paguei esta merda, ela é minha, faço o que quiser. A televisão também é minha e vou levar.

    - Porra, você me deu de presente.

    - Eu tomo. E quer saber do que mais. Além de corno você tem pau pequeno.

Saiu batendo os pés enquanto o vira-latas falou com total aparvalhamento:

    - Porra, euzinho... com pau pequeno? Corno, tá tudo legal, mas pau pequeno...

E subiu, no maior desalento, para seu retiro espiritual. Essa estória do pau pequeno rendeu. Mas fica para outra vez. Só para terminar: o ninho de amor dos pombinhos resistiu a este pequeno incidente, como o fato passou a ser conhecido na área.

sábado, 19 de julho de 2008

A Cidade Mora em Mim.

Depois de apenas uma semana acabei descobrindo que atualizar um blog diariamente não é mole não. Falta folêgo e me sinto meio autor de novela, sempre na frente. Escreve hoje para publicar amanhã. Ainda bem que não tenho susceptibilidades globais para me aporrinhar. O bom desse espaço é que sempre há um termo se casando perfeitamente com ele. Mas não me vergo aos apelos dos patrocinadores, mesmo porque não os tenho. O que me dá uma considerável vantagem sobre a concorrência; acaba que minha pena fica livre, alheia aos desejos do mercado. Minha pretensão de sempre escrever ao seu sabor, sem orientação, sem revisão, cortes, arrumações e que tais, se consolida na madrugada. Doce ilusão de ter a rédea na mão.

Acabo sempre trocando aqui, tirando acolá. Aliás, mais tiro que coloco. Creio que esta tendência de uso indiscriminado da tesoura é um sub-produto dos anos de chumbo. Não que eu tenha estado no olho do furacão, já que em abril de sessenta e quatro eu tinha dois anos e estava perdido na imensidão das geraes. Minha geração nasceu e cresceu na ditadura, mas passei ao largo dela por bons seis anos. Só descobri sua face ao mudarmos para capital. Não só a dela, mas a de um grande mundo novo, incompreensível em princípio. Lembro-me perfeitamente do dia, logo que chegamos, em que a polícia partiu para cima de uns moços barbudos bem em frente à nossa casa. Tinha um fusquinha revirado ardendo em chamas e gente correndo pra tudo quanto é lado. Era 1968. Tinha seis anos e o mundo ardia dentro e fora de mim.

A cidade grande e suas atrações me fascinaram. A televisão foi um deslumbramento. Quantas livrarias, cada uma mais colorida que a outra. O homem na lua? Inacreditável! Mais tarde, ao ler Murilo Mendes, acabei achando que o homem na lua foi meu cometa Halley. Que por sinal tive a honra de ser testemunha oculta de sua nova passagem. Sim, testemunha oculta, pois não vi porra nenhuma. Isto muito mais tarde, já lá pelos vinte e cinco anos. Voltemos ao início de minha segunda década de existência.

A vila sésamo pintava de branco o meu sorriso desbravador do novo mundo e voando pela varig eu olhava assustado.

– Ei, Beto, você tem biscoito?

Perguntava um apatetado Enio que nem desconfiava dos encantos da Gabriela. O pateta foi outro a perambular por minhas retinas infantis. Depois vieram, não necessariamente nesta ordem, Maurício de Souza, Mad, Circo, Moebius, Manara, Geraldão, Laerte, Luis Gê, Will Eissner e tantos outros. O fato é que os quadrinhos sempre me acompanharam. Mesmo porque a principal razão de nossa mudança foi dar prosseguimento aos meus estudos, já que minha mãe, minha primeira escola, dizia não ter mais nada para ensinar ao "meu geniozinho". Ficou decidido: eu era inteligente e a academia seria meu destino. Decisão profundamente entristecedora para meu avô. Mas o velho não falou nada.

Pra mim, foi ótimo. A literatura entra de vez em minha vida e passa a fazer parte de minha gênese. Descubro a maravilha do século XX: o cinema. Vejo saias rodopiando minha imaginação febril e acabo descobrindo cedo seus aromas mais sutis. A cidade passa a morar em mim.

sexta-feira, 18 de julho de 2008

O Avô

Já lancei pinceladas aqui sobre o meu avô. Aquele do rádio e das siriemas. Me lembro muito pouco dele, mas o guardado pela memória me agrada. Lembro-me de sua imensidão, maior que o buriti plantado por mim, muito maior que tudo visto por meus diminutos olhos. Creio ser conveniente esclarecer a tradição familiar de se plantar uma árvore nativa, esclarecia meu avô, em todos partos vingados. Aos mortos, nada. Durante anos acreditei piamente que havia plantado um buriti em meu nascimento. Outro dia falo nisso, voltemos ao avô. Olhos de um azul profundo e careca. Eis aí a razão de eu ser desprovido de pêlos no everest. Não era velho, ao contrário. Nos seus sessenta e poucos anos demonstrava uma disposição física invejável, maior que sua obstinação em não declarar nada. Homem de raras palavras. Quase não conversava. Costumava dizer que quem fala muito dá bom dia a cavalo e ele não entendia a língua dos quadrúpedes.

Todo final de tarde, eis a origem de minha obsessão pelo crepúsculo, o velho saia para pitar uma páia lá nos arredores da capelinha. Oratório simples construido por meu bisavô, se distanciava da sede em torno de uma légua. A fazenda mais que centenária, não era propriamente uma pequena gleba. Embora reduzida em seu tamanho original, ainda era a maior da região e meu avô conhecia cada pedaço daquelas terras. Das grutas mais escondidas ao mais soturno canto de pássaro dava notícias. Ali para ele era uma espécie de santuário. Se recusava a derrubar um piqui que fosse. Não admitia caça em sua propriedade e sua participação no mercado agropecuário era o suficiente para manter a fazenda e a grande família. Sem luxo, que isso é coisa de vagabundo desconhecedor da dureza, mas cioso da limpeza e dos trajes, da aparência correta e medida.

Lá pelas bandas da capelinha ele se sentava perto de um grande vale, sempre no mesmo lugar, e começava seu ritual. Afiava a páia, cortava o fumo com o canivete que foi de seu avô e enrolava vagarosamente o pito. E aí ficava, deixando correr o tempo, vagando em pensamentos nunca ditos. Comigo era diferente. A gente conversava com os olhos. Eu sabia tudinho. Naquelas águas navegava uma nau sem rumo. Os olhos procuravam longe. À deriva deixava seu barco vagar em bandos de pássaros voltando para o ninho. Lembro-me de que uma vez ele me chamou com um gesto e, sem nada dizer, apontou para o céu e disse: "olha". Um bando imenso de maritaca, como eu nunca tinha visto antes, passou tão longe que nem seu alarido foi possível escutar. É, o velho enxergava longe.

Soube de sua morte quando me preparava para os exames do liceu. Ainda não atinava direito com as coisas dessa senhora e havia tempo que não via meu avô. Meus pais se mudaram para a capital e, naturalmente fui junto. O velho nunca pisaria em uma grande cidade. O capataz de confiança dele me contou tudo.

    - U véi quiria qui'ocê subesse. Cê sabe qui ele era de poca cunversa. Nesse dia, o da dama de preto, ele dispidiu de todo mundo. Matutei cumigo: esse véi tá doido. Mais nun liguei muito não, ele sempre foi isquisito. Passô um tempo e nada do véi vortá. Encabulei. Fui lá. Tava o véio, mais frio que a pedra onde ele tava incostado. U ingraçado é que o paiero inda tava acesso e um punhado de pássaro, já noite arta, vuava. Uma barueia disgramada.

É, o velho enxergava longe.


 

quinta-feira, 17 de julho de 2008

O Bagulho é Sério

Este blog é assumidamente indiscreto. Por isso não vou me furtar em falar dos amigos, mesmo que isso os aborreça. Esclareço de antemão que o ser humano é sujeito e objeto da bisbilhotice. O que me dá pleno direito de exercer minha veia mexeriqueira. Nossa personagem de hoje é o Vira-latas. O Vira-latas é um bom sujeito. Conversinha mole que só. Sabe aquela cunversa pá boi durmí? Pois é! É a especialidade do mala. Carioca esperto, vinte anos de praia, tem uma nega, um violão e é mengão. Veste o manto sagrado como se estivesse limpando um santuário. O bagulho é sério.


Uma coisa é inegável. Onde o cara chega consegue alegrar a mesa com suas potocas. Já demos risadas inesquecíveis na idefectível mesa do butiquim, esta instituição mor da bobagem. Esse é assunto para outro dia. O picareta dança um dobrado doido. Se vira nos trinta, conforme apregoa famoso programa dominical. Ora é empreendedor de camisetas, no outro dia já está atuando no ramo de venda e produção de anúncios, no meio do dia já virou desenvolvedor de páginas para a rede na qual, meu parco leitor desocupado, estais deitado. Enfim, vende o almoço prá ver se janta. Tá sempre na pendura e rebolando atrás de um. A parada é séria.


Você, meu único leitor desocupado deitado na rede, poderá supor, desavisadamente diga-se de passagem, que o apelido faz menção ao complexo de vira-latas que nosso reacionário maior forjou para explicar nosso sentimento de inferioridade. Nada disso, boa alma do poupadordeporra. O cara sai revirando a lixeira. Traça o que tiver em volta. E para ele isto não é nada. Pede bis, tris... O fato é que o controle de qualidade de nosso querido membro da urubuzada é inexistente. Havia nas adjacências uma de nome S. A torcida do flamengo, do corinthians, do vasco, do bahia, só prá ficar nessas, já havia comido e muito. A danada era mais feia que mudança de pobre. Magricela, cheia de varizes, uma pele que não via sabonete e água há um bom tempo. Eu ficava só imaginando o cheiro que não iria sair daquela fonte de HPV. Só de pensar já me dava náuseas. É... no mundo há valente prá tudo. Evidentemente, como um companheiro fiél aos seus, nosso herói não se fez de rogado e, famélico, rangou a dobradinha. O bucho é sério.

Antes do embate alardeou a peleja.

- É hoje que engrosso as fileiras das estatísticas. Vou comer a S. todinha, chupar até os últimos ossinhos. Não me escapa. O muquifo tá até ajeitadinho.

Cantando em verso e prosa a epopéia programada, destilava sua macheza em doses generosas de vodka. Não economizou elogios aos encantos da moça em questão. Chegou mesmo a dizer que nunca havia tido uma visão do paraíso tão perfeita. Pensou até em comprar um viagra. Não, não precisaria. Com uma cabritinha dessa na mão não se nega fogo. E lá se foi, cambaleando entre as mesas, em busca de sua lauta refeição achada na sarjeta. O papo é sério.

quarta-feira, 16 de julho de 2008

As palavras, a idéia, a coisa.

Aproveitando o gancho do meu amigo Careca, vou escrever sobre a cesta com quinquilharias impressas que tenho no banheiro. É feita de vime entrançado e comprei em uma dessas feiras urbanas de artesanato que pululam Brasil afora, tipo a da torre. Essas feirinhas onde a oferta de inutilidades beira o grotesco. Bonequinhas aos montes e exatamente iguais, cinzeiros atrapalhando a política do antitabagismo, pifes que só o luthier consegue tocar. Porra, essa palavra gringa é muito esnobe. Vá lá, o construtor. Enfim, meus descansados e parcos leitores deitados na rede, uma míriade de objetos destinados à ornamentar a residência de uma perua qualquer.
Pois bem, voltando ao meu palco. Lá está, bem ao alcançe das mãos, meu farnel, matula de minh'alma onde crônicas, poemas, quadrinhos, jornais velhos, rascunhos, postais de locais onde nunca irei e coisa e tais aguardam uma atenção. Coisas curtas, já que o tempo de adoração não é o mesmo de uma missa. Ah, sim! Há, também, lápis e papel, um bloquinho de anotações. Afinal a inspiração é sempre produto do âmago, esconderijo recôndito guardando a obra perfeita. Rascunhos que podem acabar se tornando aquilo que o bruxo do Cosme Velho chamou de papéis avulsos. Toda essa tranqueira sem préstimo.
Nessa hora, ao obrar em nome do senhor, minhas palavras tomam assento e acenam com uma idéia. Uniforme e robusta, a coisa começa a tomar forma mais definida e clara, às vezes meio escura, depende do ânimo do criador. Além, é lógico, da força que emana de suas vísceras, como já insinuei. A sensação de bater um papo cabeça com o celite boca larga é a mesma que sentimos ao construirmos uma estrutura, precária que seja. Ao projetarmos no ar o produto das orações alcançamos a placidez do repouso. O guerreiro descansa a espada e um sorriso de alívio brota em seus lábios. Depois de terminada a pintura na porcelana, a última e merecida lágrima do labutador anuncia o fim.
Nada se compara ao prazer de vermos uma obra acabada. Umberto Eco não concordaria em nada com essa assertiva. Pronta, a mesma se prostra "a vossos peses, que sendo tantos todo plural é pouco". Com esta acho que é a milionésima vez que fico devendo algo para o poeta menor e de ritmos elementares. E me desculpe a colocação da vírgula. Mas sabe como é: quem conta um conto aumenta um ponto. Mas deixemos de digressões e voltemos ao caso.
A obra em si, nada mostra, nada revela, tudo às ocultas. Se encontra lá, na espera mansa de um furacão que a lance alhures. O que é feito após o término da linha final, da derradeira piscada da retina. De inopino a mão desfere um golpe certeiro no alvo. Uma longa e chuvosa noite se instaura. A obra desce célere rumo ao desconhecido. Rio sem fronteiras corre para o mar e a minha leitura, enfim, chega ao fim.
Lançado o poema de volta ao cesto parece que ele me olha fixamente, como que me dizendo com cruel ironia:
- Não pense você que terminando estará livre. Da próxima vez estarei aqui, te aguardando como Giovanni Drogo esperava os tártaros.
Minha vingança é que troco as provisões de minha jornada matinal, os papéis avulsos, constantemente. Nunca deixo o mesmo conteúdo na cesta. Paulatina e sorrateiramente vou substituindo todas vozes que saem daquele receptáculo. E assim caminha a humanidade. De obra em obra o papel branco aguarda a mácula da criação.

terça-feira, 15 de julho de 2008

As formigas, a barata e a grana.

Sinto uma estranha sensação ao notar casualmente minha lucidez diante de um fato banal. O fato é que a barata, inapelavelmente esmagada por uma chinelada certeira durante a mijada da madrugada, estava sendo delicadamente devorada pelas formigas e eu me comprazia nisto. Me lembrei de Raduan Nassar. Achei que estava possuido por uma esquisita indecisão obssessiva e, porra, logo de manhã. Uma zona total. Não sei se jogo a barata no lixo ou se deixo as formigas prosseguirem em sua lauta refeição. Se escolho a última terei um lento processo de limpeza ao mesmo tempo em que aquela visão se manterá diante de meus olhos. Creio ser melhor que as formigas consigam seu rango em outra freguesia. Mas deixo tudo como dantes no quartel de Abrantes.

No velho rádio toca uma canção antiga, daquelas de molhar o coração de uma mãezinha. O rádio merece alguns comentários. Foi herança do meu avô e sempre me acompanha, onde quer que eu vá. Grande e pesado possui um corpo de madeira estupendamente talhada e com um alcance incrível. Foi ouvindo nele a BBC de Londres que aprendi meu inglês macarrônico. Mas a barata me persegue. Seria eu um sádico destruidor da cadeia alimentar? Ou apenas precipitei o processo ao fornecer a gororoba? Na verdade, vendo as formigas devorarem aquela gosma fétida, sentia um prazer doentio. Buscando explicações lógicas, como é de meu feitio, criei a desculpa científica para minha exultação ao presenciar a lenta agonia da carcaça apodrecida. Qual seria a razão de tamanho prazer? Seria uma barata a bravata de Gregor Samsa? Ou estaria metamorfoseado num inseto monstruoso? Só que o quarto não é meu e nem sou caixeiro viajante.

E lá estava aquela massa pútrida. Alheia às minhas elocubrações ia sendo vagarosamente consumida pelas formigas em sua faina incansável. Minha imobilidade era tenaz. Aliás, não tomar decisões é uma de minhas especialidades. E a canção continuava em seu lento murmurejar monótono. Creio já ter ouvido isto, mas não lembro direito. A memória é uma arapuca espessa envolvendo lentamente o que não pode ser resgatado. Apenas a lembrança traidora do fato. Me pergunto sempre se não passo de uma personagem sem direção, o papel de um aloprado perdido no meio da cena, sem fala e fadado a perambular a esmo. A platéia, meio sem jeito, ignoraria sua presença. Fazendo com que sua atuação nao passasse de mera figuração social, assim como os enjeitados desfilando sua miséria na consciência cristã da compaixão.

As pequeninas formigas, negras como tição, se acotovelavam ao redor do presunto em uma obstinada lida, arrancando naco por naco a geléia para sua despensa. No rádio a canção já tinha acabado há muito e eu nem percebera. Ficara suspenso em um tempo imóvel. Com a mesma música a embalar a mesma cena, o mesmo gesto. Já passava da hora e eu estava bastante atrasado. Sai em polvorosa rumo à garagem. Ajeitando gravata fui praguejando minha distração. Porra, já são duas horas. Caralho, aquele filho da puta do Antenor vai me encher o saco, pensei ao lembrar que teria que lidar com aquele jumento... e na maior gentileza. Bem que ele poderia ser a barata e eu as formigas. Só vou aturar ele porque a vadia da minha ex-mulher me fudeu a vida e tô mais duro que pau de tarado na solitária. Além do mais a grana é boa e aquela vaca nao vai meter a mão em nenhum centavo. Aí me mando por uns três anos vadiando pelo mundo. Afinal, nao era um de meus sonhos? Vagar mundo afora, andar sem rumo por aí nao foi sempre meu maior desejo? E que se foda baratas, formigas, vacas, asnos...

Ainda bem que esta cidade, além de bela, é fantástica. Um dia ainda vou morar aqui, pensei. Em menos de dez minutos cheguei à reunião que me salvaria da miséria. Ao entrar no prédio dei de cara com o Antenor. Até no nome o sujeito é uma anta. Mas como é o dono da grana, quer porque quer que eu faça o trabalho, vai pagar o que pedi e eu estou na pior... vamos para o cadafalso. A reunião foi rápida e tremendamente proveitosa para mim. Para minha surpresa a reverendíssima besta estava de bastante bom humor. Me disse que passou a noite analisando meu trabalho e que estava muito, mas muito mesmo, satisfeito com o projeto. Trabalho aprovado, entregue e devidamente pago me mandei rapidamente para o hotel após as rasgações de seda de praxe. Tomei uma demorada ducha enquanto me voltava novamente para a barata. Lá estava a cena: a barata reduzida pela metade e um número de formigas aparentemente maior. Liguei para a recepção, pedi para fechar minha conta e mandar um rapaz para pegar meu rádio. Enquanto ensacava minha minúscula bagagem notei que a barata estava quase sumindo. O que confirmou minha teoria de que o número de formigas havia aumentado. Antes de sair lancei um último olhar para o palco da pequena tragédia que acompanhei. Sorte de uns, azar de outros e a fila anda, concluí. Fechei a cortina e segui para a recepção onde tive um inesperado encontro com o Antenor. Para minha surpresa o muquirana havia pago a despesa, devolvido o carro e me levaria ao aeroporto. Porém, a surpresa maior foi, no caminho para o aeroporto, o Antenor me dizer que havia alugado, com todas, mas todas mesmas, despesas inclusas, uma casa nos arredores de Paris para que eu pudesse ficar um aninho fazendo nada. De cima vejo mais uma vez esta bela cidade. É... um dia ainda moro aqui. Mas por ora, Paris.

segunda-feira, 14 de julho de 2008

Siriema Espevitada

Ontem vaguei a esmo pela cidade. Acho que gastei um quarto de tanque só para fumar unzinho. Foi bom. Fui em lugares que há muito não ia. A plácida paisagem da Ermida continua a mesma, só estranhei a demora dos ipés em florirem. E continua, a despeito de toda controvérsia, lindo o Palácio da Alvorada. Aproveitei que estava por ali e fui em direção ao cerrado que não há mais. A especulação imobiliária desta cidade está foda. Só que agora as invasões são de pequenos burgueses expulsos pelos preços proibitivos da opulência que se instaura na cidade. Palhaçada... pessoas que se dizem informadas dando uma de João sem braço. A histeria da classe média é medida na razão direta de sua hipocrisia. Mansões de um mau gosto terrível dominam a paisagem e não entendo patavina de Arquitetura. Apenas moro, cresci e amo uma maquete.
Uma cena me despertou curiosidade. Havia uma moça triste e solitária apreciando as águas paradas no ar do planalto. De supetão ela se levantou e desabalou a correr. Sua silhueta fina, comprida e pernas desmedidas davam a impressão de uma siriema correndo. Me lembrei da fazenda de meu avó. Siriema era praga. Da porteira até a sede era possível contá-las em centenas. Bicho mais engraçado. Desconjuntado, burro e adorável em seu canto ressequido pelas chamas das queimadas na seca de meio de ano. A mocinha estancou de repente. Olhar perdido parecia não entender sua atitude patética de siriema espevitada. E me desinteressei pela cena.
Saindo dali pensei em ir visitar meu compadre, a quem não vejo uma data. Desisti. Ando muito anti social e não estava querendo conversa com ninguém. Resolvi fumar outro enquanto voltava para casa.
Na descida para a ponte JK ganhei um belo presente. Um daqueles poentes de maio que só o céu daqui nos oferece. Pintado de um amarelo alaranjado o sol descortinava um azul profundo se misturando em pinceladas sutis de rosa. Realmente o cerrado mostra toda sua beleza é na seca. Acabei parando por ali e por ali fiquei até que um guarda de trânsito veio me apresentar uma bela multa por parar em local proibido. É... para uma obra de arte até que ficou barato. Fui.