segunda-feira, 4 de agosto de 2008

Brasília.

Brasília é minha história e mito. Com ela coloquei o horizonte em mim. Afinal, como já disse a Clarice Lispector, "Brasília é construida na linha do horizonte". Só não penso que seja artificial, mesmo sendo uma maquete. Até o lago, em sua sina de buraco escavado, é a personificação do mistério claro, límpido na boca de cena escancarada. Falo de lonjura como negação do próximo, pois o distante pode ser alcançado passo a passo. Não há caminho rumo ao horizonte. Sua indimensionável espacialidade está diante de nossos olhos, porém fora de nosso alcançe. A ilusão dos tolos é não saber que a terra é redonda.

A minha maquete brilha longe. Tingida pela barra da madrugada toca um violão choroso, pinta com som os amplos espaços, rasga com uma cimitarra a pele da aurora descortinando mais um dia. A cidade se posta, no centro, altiva e soberana. É uma cidade excessiva. E como nos diz Álvaro de Campos, o homem tem de exceder-se, porque tem sempre diante de si um mundo excessivo. Penso eu que esse heterônimo é um belo exemplo do subjetivo otimizando a poética, dentro de uma percepção inicial, modernista. Na verdade é um contraponto ao objetivismo pagão do "mestre"de todos heterônimos do vate luso.

Eu tenho uma cidade para além do mundo. Nessa mistura do espaço com o tempo, a história floresce no ipê. Bem sei que alguns torcem o nariz, outros a tratam como se trata um mendigo; a ignoram solenemente. Imagem pálida de sua cegueira. Muitos são aves de rapina devorando a presa. Alguns, poucos, conseguem flutuar na eternidade da "cidade traçada no ar". Vários, os mais empedernidos, vêem aqui a sua caverna da riqueza. Um balcão de negócios onde beduínos recebem magnânimos os convivas do convescote.

Seria eu um brasiliário? A resposta não existe. Poderia falar sobre o decantado céu da cidade, poderia até mesmo esbanjar todos clichês, mas o respeito que tenho não permite que eu seja apenas mais um dentre tantos. O olhar gasto não dá conta, a vista turva da mesmice é redutora. Quem como eu, viu Brasília crescer não esconde a tristeza de ser testemunha de um crescimento irresponsável iniciado por um famoso político goiano. As necessidades humanas estão sempre sujeitas aos desmandos desses barões.

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