Geralmente não gosto de personagens que revelem algo de mim, mas com Kólia Krasótkin foi diferente. Adianto que não gostar de personagens parecidas comigo não significa receio de me reconhecer, mas simplesmente crer que eu não seja uma pessoa interessante, digna sequer de uma nota no obituário. Ao me perceber na arrogância petulante desse moleque astucioso, agradei-me profundamente de sua representação se levando a sério, em demasia eu diria. Noto como meu festim adolescente seguiu trilhas parecidas e percebo, meio aturdido, como ainda traço um compasso similar.
Não que eu ainda queira educar ou liderar alguém, acho que isso está muito além de minhas possibilidades, mas as atitudes de déspota esclarecido ainda charfundam em máximas proferidas com grande sapiência, com enfáticas sublinhações e coisas que a gente não entende nada. Assim como Kólia, permaneço com um amor-próprio egoísta impedindo que eu me desvencilhe do despotismo. É como a história do alemão, no mesmo trecho, jogando em nossa cara colegial os "conhecimentos nulos e uma presunção sem limites". A diferença é que hoje, aos oitenta anos, posso me dar ao luxo de não entender absolutamente nada e berrar aos quantro cantos que li e compreendi Voltaire e Bielínski. Já não sou um menino que ouviu alguém dizer. Aos reticentes provo com minha memória.
No despertar da adolescência somos poderosos, trazemos todas soluções e não nos defrontamos com patranhas, pois elas não existem. Além do que, o ridículo é uma pálida mancha que não nos faz sombra. Aliócha tinha razão: o tempo exerce grande influência nas idéias e só ele, nada mais, dota-as de personalidade, de palavras. A frivolidade é nossa companheira e tudo se resume ao desenlace de mais um lance de dados. Andamos de braços dados com o acaso. Nossas loucas aventuras são passaportes para a leviandade e o pedantismo. No entanto, são, também, o vigor, o esteio da velhice, essa ingrata senhora que vai nos subtraindo aos poucos o desejo de correr livre, feito cavalo chucro largado na campina.
Hoje meus olhos possuem a reflexão soturna da noite, uma certeza calma e silenciosa, mas inflexível e cua rota não se desvia do distrate com a vida. As peripécias de outrora são apenas fogos iluminando uma janela escura da lembrança. O palco de meus golpes está sem luz, minha reputação de maluco consolidada, minhas espertezas findas e só resta uma, de negro, na platéia. Mas não é minha única leitora. A cortina se fecha.
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