segunda-feira, 1 de setembro de 2008

A Casa Real de Tebas.

Minha linda e única leitora, não direi que cheguei até aqui por causa de sua benevolência para com esse pobre escriba menor, mas depois que coloquei em movimento a engrenagem dessas crônicas muitas inquietações assaltaram meu espírito. Dizia ele assim: - Maldito, qual a razão de ir com tanta pressa para o cadafalso? Miserável, então tens receio do futuro e queres voltar? Dessa maneira minha jornada, com um caminho curto, se torna longa. Falo apenas do que me diz respeito, não serei eu a proferir coisas alheias, isso eu deixo para o narrador.

- Então porque hesitas?

Me pergunta, com um arzinho cínico. Questão mortal para quem tem a língua travada, a pena calada. Hesito ao perceber o engenho sutil surgido no interior dessas crônicas, levando-as para além do esperado. Vacilo ao notar opinões enfáticas, oscilo ao sacar a tentativa de Erínia em cumprir seu desígnio. Mas meus crimes de sangue é a própria desobediência, o que a torna personagem fora de foco. A tibieza nasce de uma visão única. Um só modo de ver revela apenas o oco. Ao nos julgarmos únicos, donos de argumentações mais sólidas que os demais, ou ao pensarmos ter um espírito incomum, como nenhum outro, nos mostramos nus em nosso palco vazio. Não que eu esteja fazendo uma apologia ao servilismo humilde e pusilânime. Ao contrário. Uma alma nobre, ao se confrontar com a injustiça, não se conforma com a obediência cega e burra.

Há muito vi a filha de Édipo, nascida de um leito amaldiçoado e causador de doloroso desgosto, ser conduzida ainda viva ao sepulcro, sem esponsais, sem himeneu e sem tálamo. Sempre os dramas familiares trazendo trevas clamando por vingança. Às vezes penso ser uma mera marionete nas mãos de divindades perversas fiando meu destino. Não que eu seja um Labdácido, mas a história da casa real de Tebas me toca. A proibição divina de descendência é meu grande argumento para não ter filhos. Acredita você, minha única leitora, que isso me atormenta? Não, você não crê, vejo em seus olhos.

Meu destino trágico não será traçado com rezas, nem com coros, nem será fios em uma mão invisível. A bela desgraça se aproximando traz a certeza da vilania e não é nenhum conto das Mil e Uma Noites. Até o dedo mindinho de meu pé bichado sabe a sinopse. O narrador mais uma vez exibe em seus lábios trêmulos aquele arzinho cínico. Parece até que vai ter uma crise de epilepsia. Acho melhor parar, senão o cara vai ter um troço.

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