Gostaria de escrever algo sobre o nada. Desejo muito estar em mim, mas não existo. Não sou de verdade, sou uma personagem projetada, uma mera ilusão. Um dia pensei em ser feliz. Tola ilusão, doce parcimônia de um espírito louco. Um dia, não faz muito, sonhei em ser alegre, tudo, mais uma vez, não obstanbte minha amargura, se tornou mera ilusão. Meu cioso leitor há de desculpar os devaneios dessa mente corroída pelo álcool, pela miséria humana asssolando meu peito, vá lá, eu sei, é vulgar, tenho plena consciência de meu prosaismo, diria até pernoticismo.
Assim como você, minha sensual leitora; aliás me vejo obrigado a reparar que de todas as pessoas que vêm aqui, a senhora é de quem gosto mais, não que seja lá um elogio, porque não vem tanta gente assim; não tenho em mim a pretensão de ser, apenas estou, meio deslocado, sem jeito, mas estou. As míseras estirpes do acaso e da aflição, eis aí minha condição. Não ter nascido, não ser, seria melhor ainda. Contudo, estou aí, vagando a esmo pelo mundo, copo na mão e cada vez mais parecido com meu pai. Então sobrevivo a mais um dia de perdas. As recentes, com feridas carcomendo a alma, exalam um cheiro pútrido, proveniente de pus infeccionada, revelam descaminhos antigos, agora ressuscitados pela esperança frenética da ventura. Um dia imaginei a satisfação como uma bela moça de olhos brilhantes, cuja sede de liberdade lhe fosse bastante cara.
Confesso que minha mente é errante e não emprego nenhum engenho na imposição de uma disciplina. Recuos, manobras, mesmo as mais simples, são desconhecidas de meu ritmo intelectual. A sensatez, o discernimento são coisas com as quais não me ocupo. Não vejo interesse algum na prudência. Ademais, não serei eu a cortar o elo da cadeia que prende o senso comum. Estou velho, cansado e acabado; sou tão interessante como o jornal da semana passada. Recordo-me do dia em que conheci a beleza e a injuriei, como diria certo herdeiro da ancestralidade de bardos gauleses. Foi um dia singular, uma sucessão de estranhos pressentimentos mostrando o fim. Trajetória já revelada de minha infâmia. Os caminhos sinuosos do destino já traçados na dura retina. Eu sempre soube que havia coisas erradas comigo.
Para não me alongar agradeço a presença de meus dois leitores. Foi muito gentil terem vindo hoje – perdendo um tempo precioso com textículo tão mal alinhavado, tão longe de suas ocupações, e eu sou apenas um menino maluquinho, ainda. Sim, só me ocupo com bobagens.
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