quarta-feira, 17 de junho de 2009

O Mala Enganado

O cabra entrou ressabiado, como quem não confia nos próprios passos. Sujeito baixinho; pouco mais de um metro e cincoenta, magro, sombrancelhas arqueadas e um par de olhos abertos e esbugalhados; era um vaporzinho de bagulho em uma boca de pouco movimento. Estava muito mais para papagaio de pirata do que malandro. Mas se achava o tal. Pensava que fazia e acontecia. O escrivão, do alto de sua arrogância subalterna, aquela do tipo subserviente aos maiores e sonhando em ser o maioral, interpelou o camarada:

- O indíviduo tá querendo o quê?

- Bem doutor, é que... sabe, fico meio sem jeito, aqui nesse lugar...

- Desembucha ou desembesta, não fica de lorota não.

- Sabe doutor, é que fui enrrolado por uns malas aí e tô a fim da caveira deles.

- Você quer fazer uma queixa? É isso?

- Isso Doutor, uma queixa.

- Entra, vai falar com o Doutor.

Sem resmungar o Mané entrou na sala. Mas, o delega, que andava bronqueado com a mixaria que ganhava, não estava a fim de suportar malandro chorando pitanga.

- Qual é a parada?

Acanhado, o mala tremeu nas bases e ficou mais parado que poste. Não se mexeu, não pronunciou uma palavra, abaixou a cabeça e tentou sair. Não pôde. Todo ruim dentro da roupa, o delegado vociferou:

- Que que há, pilantra? Perdeu a língua? Tá pensando que isso aqui é hotel? Que tu quer?

Tudo aquilo enjoou o loque. Malandro manso e tinhoso como era, percebeu que tinha entrado na maior roubada. O jeito foi contar o caso.

-Bem doutor, tava eu lá na maior batalha, sabe como é, os bacuri prá criar, mulher pra sustentar, a gente se vira nos trinta, faz o que pode e o que não pode pra se ajeitar nas quebradas do mundaréu. Como ia dizendo pra vossa merítissima, tava na maior ralação, ganhando o leite da molecada e uns pilantras me deram a maior volta.

- Porra, diz logo o que aconteceu, não enrola.

- Como eu tava dizendo, uns otários me engrupiram. Compraram e não pagaram.

- E o que eles compraram?

- Maconha.

A resposta foi um tremendo esculacho:

- Vai prá puta que o pariu, seu desgraçado. Tou dormindo e tu vem aqui pra isso? Agora tu vai ver. É cana, vagau. Se tu se coçar, ta fudido.

E, xingando, o delegado se afastou e foi tomar as providências para enjaular o otário.

O escrivão, rindo da cara de surpresa do papagaio, até achou graça e deu a letra:

- Trouxa tem que comer capim pela raiz.

E assim mais um foi ver o sol nascer quadrado.

Nenhum comentário: